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Movimento Indignação
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27 avril 2011

Motivos para chorar torrencialmente

 

 Veja na tabela abaixo por que nós, trabalhaores da justiça do Rio Grande do Sul, ao invés de sorrir abobalhadamente, temos motivo para nos escabelar como amante histérica de coronel nordestino no enterro do "painho".

Como resultado do descumprimento da Constituição Federal, que assegura no art. 37,X, a revisão anual geral do salários dos servidores públicos, cada um de nós perdeu, somente nos últimos 3 anos (março de 2008 a abril de 2011) os totais abaixo (atualizados para abril de 2011).

CARGOS 1º grau (exemplificativos)

PADRÕES

1.º grau

ENTRÂNCIAS

1º grau

LETRAS

Tribunal

PERDA GLOBAL

salários básicos

 

Auxiliar de Serviços Gerais

PJ-B

Inicial

B

44.481,69

Intermediária

C

47.666,85

Final

D

50.998,82

 

Atendente Judiciário

PJ-D

Inicial

E

58.244,96

Intermediária

F

62.444,02

Final

G

66.790,23

Oficial Escrevente

PJ-G-I

Inicial

H

83.742,02

Intermediária

I

93.159,08

Final

J

103.590,04

Oficial de Justiça

PJ-H

Inicial

M

106.779,24

Intermediária

N

116.774,47

Final

O

127.788,31

Oficial Ajudante

PJ-I

Inicial

----------

153.345,84

Intermediária

----------

164.123,51

Final

----------

175.594,58

Escrivão

PJ-J

Inicial

P

219.264,27

Intermediária

Q

234.677,41

Final

R

250.906,56

 

Estes valores correspondem ao que deixou de ser pago em razão da inexistência da reposição anual da desvalorização decorrente da inflação, levando-se em conta os salários que nos eram pagos em março de 1990, atualizados pelo IGPM/Foro, e os que efetivamente recebemos a cada mês, também devidamente atualizados. E não contemplam as vantagens temporais pessoais, mas somente o vencimento básico de cada cargo/padrão remuneratório. Se as levarmos em conta, o prejuízo é bem maior. E se fosse respeitado o princípio da isonomia - salário igual para trabalho igual, os valores referentes à entrância final serveriam a todos.

Em média, a inexistência de reposição na data e na integralidade da inflação, fez com que perdêssemos, para sempre (pois qualquer reajuste jamais retroagirá àqueles meses) uma fatia de 57,90% do que efetivamente deveria ter sido pago. Como a reposição da inflação apenas "atualiza" os salários, permitindo que continuemos a comprar as mesmas mercadorias que comprávamos originalmente, a verdade é que, quando o reajuste é insuficiente e não ocorre num período de tempo fixo, acabamos por ter confiscado algo que já era nosso. E que a reposição total da perda apenas devolveria, não acrescentando nada além.

 

A "política salarial" do Tribunal para os servidores, nestes últimos vinte anos, portanto, corresponde à uma olho_bandeira_brasilverdadeira expropriação da propriedade alheia (o valor econômico efetivo dos salário dos servidores) a fim de possibilitar folga no orçamento para que a classe privilegiada do Judiciário (os 9% que abocanham mais de 37% do total gasto com folha de pagamento), constituída da magistratura, possa gozar de aumentos reais (acima da inflação, e, portanto, acréscimos de valor econômico) e de fartas indenização, no mínimo questionáveis, como o famigerado auxílio-moradia retroativo à década passada.

 

Ao não nos concederem sequer a inflação ocorrida (na sua integralidade), simplesmente nos foi tomada, à força e sem apelação, não apenas uma parte substancial da nossa remuneração, mas toda uma série de possibilidades de vida, que foi frustrada e nunca mais será recuperada. A comida que deixamos de consumir, as roupas que não vestimos, o ensino, a cultura, o lazer que deixamos de ter e dar a nossos filhos, é resultado desta pérfida política, pensada e executada propositalmente, assim como todas as neuroses, úlceras, cânceres, ataques cardíacos e mortes prematuras decorrentes de uma vida vivida pela metade, de abundante sacrifício (consequente da falta material e pessoal de condições dignas de trabalho) e de parquíssimas condições financeiras.

 

Imagine agora, se você tivesse recebido a justa reposição do que lhe pertencia (e, além de confiscado pela alta dos preços, foi sonegado pelo Tribunal), e separado estes valores em uma poupança, num sacrifício voluntário, para poder adquirir algum bem de porte. Em  apenas três anos (nos últimos três anos) um simples oficial escrevente de entrância intermediária (salário médio do judiciário), poderia, com seus vencimentos básicos, comprar hoje um bom apartamento de dois quartos em qualquer cidade da Grande Porto Alegre por exemplo.


 tjborges__2_

Porto Alegre, 13 abril. Cerco ao TJ. Início da Primavera de Abril.


Se este absurdo não o sensibiliza, companheiro servidor, sorria, se esfalfe em infindas e pesadas horas extras não remuneradas, e ainda cantarole quando lhe exigirem mais e mais dedicação e lhe oferecerem como "plano de carreira" a retirada de direitos históricos como a possibilidade de só se remover mediante o próprio pedido, por exemplo.

 

Mas se a visualização dos números colabora para que, legitimamente, o companheiro se escandalize mais contundentemente, compreenda e se conscientize do processo responsável por sua infelicidade, PARALISE AMANHÃ TUAS ATIVIDADES, DAS 13 H 30 MIN ÀS 14 H 30 MIN, desligue o teu computador e vá para a frente do Foro, de preferência com um nariz de palhaço, em desagravo a esta realidade em que te tornaste, contra a própria vontade e dignidade, o próprio otário!

 

movimento

               INDIGNAÇÃO

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25 avril 2011

Ave, Venerável Corte! Os que vão tombar a caminho do trabalho vos saúdam com sorrisos!

Se o leitor, eventualmente, acha que o título acima é irônico e debochado é por que ainda não teve o desprazer de ler o ofício circular n.º 57/2011 da Corregedoria Geral de Justiça, que, num momento no mínimo inadequado, dá conta do lançamento da infeliz campanha "SORRISO GERA GENTILEZA ", na qual se pretende incentivar os servidores a  "praticarem a cortesia, promovendo um melhor ambiente de trabalho por meio de pequenos gestos e atitudes, como um simples sorriso", conforme noticiado no site do Tribunal de Justiça na última quarta-feira, às vésperas do feriadão de páscoa.

Se o ofício é seco e burocrático, se resumindo a noticiar o envio de material a ser colocado nos balcões para que advogados e partes "avaliem" o atendimento, a notícia festeja, da forma mais infeliz e insensível, a dita campanha, que pretende "fazer com que as pessoas se desarmem e minimizem as tensões na hora do atendimento no balcão - e que este momento, preferencialmente, seja acompanhado de um sorriso", nas palavras do assessor do Plano de Gestão de Qualidade do TJRS, Paulo Petry*.

Afora a óbvia insinuação de grosseria e falta de profissionalismo sobre os servidores, é, no minimo irônico e debochado, isto sim, o seu lançamento, casualmente no dia do próximo pagamento dos salários, num momento em que a grande maioria dos trabalhadores da justiça, indignada e enfurecida com a completa falta de condições financeiras e de trabalho, espera do Tribunal uma resposta decente e concreta às suas reivindicações por uma política salarial digna e a realização imediata de concurso público para suprir as mais de 1.800 vagas existentes (ou seja, servidores inexistentes), entre outras necessidades graves e prementes.

É inacreditável, quando os servidores se preparam para mais uma paralisação de uma hora de trabalho, no próximo dia 28, reclamando um mínimo de dignidade, que o patrão judiciário, às suas vésperas, tenha a capacidade de responder com uma verdadeira piada de mau gosto. Se o Judiciário do Rio Grande do Sul pode se gabar de ser tido como "o melhor do Brasil" e se o atendimento à população ainda não atingiu níveis absurdos de precariedade é justamente pelo sacrifício espontâneo da grande maioria dos servidores, que, à própria custa e de suas famílias, tem se esfalfado até doze horas por dia, nos seus setores, para dar conta da demanda absurda de serviço, que se agrava com a falta crônica e gigantesca de funcionários.

Na própria matéria veiculada, a psicóloga do Plano de Gestão de Qualidade, Míriam Vucetic, "alerta que o estresse comprovadamente é o fator responsável por um alto índice de doenças cardíacas, gástricas e, principalmente, de depressão entre os servidores em todo o Estado".  Como se vivêssemos, entretanto, num mundo de fantasia, apartado da cruenta realidade, deixa de citar que este estresse é conseqüência de um trabalho sobre-humano, exercido sob condições precárias e injustas, sem que recebamos o mínimo reconhecimento, nem mesmo a reposição inquestionável, e garantida na Constituição, da desvalorização salarial decorrente da inflação.

No país das maravilhas da visão patronal, parece que tudo se resume a uma questão de auto-disciplina e tratamento emocional. A sobrecarga não existe, as carteiras dos servidores são recheadas, os bolsos estufados e as cédulas e moedas, ao invés de apenas transitarem pelo caixa do banco no dia do pagamento, correndo, num vôo desabalado para os bolsos dos credores que têm a sorte de ser pagos, sobram fartamente e se entesouram nas contas bancárias e baús. Todos têm uma jornada de trabalho, e uma demanda de tarefas, que lhes permite conviver harmônica e criativamente com suas famílias, todos podem estudar, ter seu lazer e crescer humana e economicamente na vida, com todas as oportunidades, numa carreira racional e justa, sem sobressaltados nem preocupações. E se não são felizes é porque tem a estranha mania de andar ansiosos, perscrutando um incerto futuro, o que os deixa cabisbaixos e de cara fechada. Mas este é um problema que, para cessar, necessita somente de um sorriso! Se alguns tombam a caminho do trabalho, assoberbados, e infelizes porque estão há anos distantes da família ou porque estão infectados pelo H1N1 e não têm o direito de se tratar - pois patrão terceirizado não aceita atestado médico, é um problema fortuito, que ainda não se pôde resolver, mas não é fruto de uma estrutura pérfida e injustificável que dispõe todas as regras e carreia todos os recursos para o privilégio de 10% dos quadros do Poder, enquanto as condições econômicas e funcionais dos 90% restantes (os funcionários), e o atendimento efetivo à população, padecem da devida atenção e prioridade.

Infelizmente, nós servidores, vivemos num outro universo. Concreto, duro e sério, que não permite fantasiar e muito menos rir à toa. E o que necessitamos, agora, é de uma resposta decente do Tribunal de Justiça quanto ao nosso drama, especialmente à reposição salarial imediata de 27% e a garantia de recuperação da inflação futura anualmente, bem como do restante das perdas históricas até daqui um ano. Além é claro, da elaboração, em comissão paritária com os servidores, de um plano de carreira lógico e digno, da adoção imediata da jornada contínua de sete horas e do pagamento dos juros da URV atrasados nos valores legalmente devidos, sem expurgos absurdos. O momento é grave e não se presta a palhaçadas. Falar em descontração e maneirismos de meiguice quando milhares se encontram a ponto de estourar, depois de anos e décadas de sacrifício inglório e não recompensando, é um acinte, um achincalhe inaceitável e inédito, talvez só visto quando a finada rainha francesa Maria Antonieta, às vésperas da Revolução popular que havia de ceifar seu pescoço, enfeitado de jóias brilhantes e chiques, na guilhotina, perguntou à multidão faminta de camponeses que rugia às portas de Versalhes: "se não tem pão, por que não comem brioches?".

Muitos de nós ainda não tombaram no trabalho árduo e no sobressalto permamente porque foram favorecidos pela sorte, mas do sacrifício de quantas servidoras Cláudia Maria e Rosinha ainda necessitará a alta cúpula administrativa do Tribunal de Justiça para enxergar o drama que vive a massa de seus funcionários, no porão do navio, enquanto alguns nobres senhores gozam em farto banquete no convés?

Se o patrão infelizmente prefere virar o rosto à realidade feia e inconveniente, a nós, como classe de trabalhadores recém desperta de um pesadelo de anos, e recém nascida para a luz da consciência e da capacidade de lutar por si, em plena liberdade e solidariedade, pela dignidade própria, só resta manter firme, o nosso propósito e aprofundar a pressão, da forma mais séria e contundente, para que sejamos ouvidos, e tenhamos garantido um mínimo de dignidade em troca da doação absurda e sem sentido com que nos dedicamos, com toda seriedade sim, mas sem sisudez, nem falsa alegria, ao serviço público para o qual prestamos o concurso.

O Movimento Indignação conclama a todos os trabalhadores da Justiça do Rio Grande do Sul que rechacem o circo e a palhaçada, e demonstrem, sem afetação, nem dramas falsos, mas com toda a racionalidade e contundência o seu descontentamento, e a sua vontade inquebrantável, paralisando das 13 h 30 min às 14 h 30 min em frente aos Foros e setores de trabalho no próximo dia 28 de abril! E, se os salários lhes permitirem, façam uma gentileza válida, que simbolize a nossa ira  justa e solidária. Comprem rosas vermelhas e as presenteiem, nesta Primavera de Abril à população durante o movimento.

Movimento
     Indignação
 

_____________
*
membro do Conselho Fiscal do Sindjus-RS

24 avril 2011

100 maiores litigantes do Brasil: alguma coisa está fora da ordem!

 

Portinari___Crian_a_Morta___1944__2_


Criança Morta - Portinari

100 maiores litigantes do Brasil: alguma coisa está fora da ordem!

 

*Gerivaldo Alves Neiva, Juiz de Direito, abril, 2011.

 

 

Eu não espero pelo dia

 

em que todos

 

os homens concordem.

 

Apenas sei de diversas

 

harmonias bonitas

 

possíveis sem juízo final...

 

Fora de Ordem, Caetano Veloso.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) divulgou recentemente um relatório informando o nome dos 100 maiores litigantes no judiciário brasileiro. Já imaginávamos quem seriam eles, mas faltava a informação oficial. Este relatório está disponível para download no próprio site do CNJ.

 

Para início de conversa, vamos observar apenas os 20 primeiros nomes divididos em públicos e privados:

 

PÚBLICOS (colocação)
PRIVADOS (colocação)*
INSS – 1º
Banco do Brasil – 5º
CEF – 2º
Banco Bradesco – 7º
Fazenda Nacional – 3º
Banco Itaú – 8º
União – 4º
Brasil Telecon Celular – 9º
Estado do Rio Grande do Sul – 6º
Banco Finasa – 10º
Município de Manaus – 11º
Banco Santander – 13º
Município de Goiânia – 12º
Banco ABN Amro Real – 14º
Instituto de Previdência do RS – 20º
BV Financeira – 15
 
Banco HSBC – 16
 
Telemar – 17º
 
Banco Nossa Caixa – 18º
 
Unibanco – 19

* incluindo as sociedades de economia mista.


Nossa previsão estava correta: dos 20 maiores litigantes deste país, mais da metade é composta por grandes bancos, que lucram bilhões a cada balanço. A outra parte, menos da metade, também como imaginávamos, é composta por entidades do Estado, ou seja, quem mais litiga no Judiciário brasileiro são “caloteiros” ou “gananciosos” que assim agem por convicção de violar a lei em seu próprio benefício, e não por desconhecê-la.

 

Sabemos todos que estamos neste meio que o Estado e Bancos quase sempre são demandados por não cumprirem seus compromissos e obrigações (Estado) ou por violação ao direito do consumidor (Bancos). Fora disso, o Estado demanda quando executa contribuintes e os bancos quando cobram de consumidores em mora.

 

Com relação aos bancos, em qualquer hipótese, seja demandante ou demandado, são situações causadas por eles mesmos, ou seja, violam o direito do consumidor ou estipulam juros e taxas exorbitantes que seus clientes não podem pagar, resultando sempre em uma ação judicial, seja como demandado para reparar danos ou revisar cláusulas contratuais, seja como demandante para cobrar de clientes em mora.

 

Em favor dos bancos, o STJ já decidiu:

 

Súmula 380 - “A simples propositura da ação de revisão de contrato não inibe a caracterização da mora do autor.”

 

Súmula 381 - “Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas.”

 

Súmula 382 - A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade.”

 

Súmula 385 - “Da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento.”

 

Além disso, entendeu o STJ, (Resp 1083291) que a postagem de correspondência ao consumidor para prévia notificação de inscrição em cadastro de proteção ao crédito não precisa ser feita com aviso de recebimento (AR). Sendo assim, é desnecessária a comprovação da ciência do destinatário mediante apresentação de aviso de recebimento (AR).

 

De forma sofisticada, o sociólogo português Boaventura de Sousa Santos define esta situação como sendo uma espécie de “privilégio do poder” dispensado pelo Poder Judiciário a determinadas categorias, ou seja, “o privilégio do poder junto à justiça, traduzido no medo de julgar os poderosos, de investigar e tratar os poderosos como cidadãos comuns”. (Santos, Boaventura Sousa. Para uma Revolução Democrática da Justiça. São Paulo: Cortez, 2007).

 

Ora, sendo ou não o caso de privilégio dos bancos e do Estado, a sensação que se tem, depois da divulgação do relatório do CNJ, é que o Poder Judiciário brasileiro vive a ilusão de distribuir a Justiça, mas não passa de cúmplice de um Estado “caloteiro” e de um sistema bancário “ganancioso” que viola o direito do consumidor, gerando lucros bilionários a cada balanço, apostando na nossa falta de estrutura e deficiência de pessoal.

 

E vamos todos nós vivendo esta ilusão: o Estado e os Bancos violam deliberadamente a lei em seu proveito próprio; aumenta a cada dia o número de ações ajuizadas neste país; as condenações são irrisórias para o consumidor e insignificantes para os bancos; o CNJ exigindo que os Juízes, com as mesmas deficiências de sempre, cumpram metas para responder a esta falsa demanda e, como não está sendo possível, nós juízes levamos a culpa e somos chamados de preguiçosos e descompromissados com a Justiça.

 

E assim, enquanto vivemos esta ilusão de que estamos distribuindo a Justiça, o Brasil já conta mais de meio milhão de pessoas presas, sendo que, segundo dados do Ministério da Justiça, 74,88% dos presos cursaram até o ensino fundamental; 71,39% dos presos tem de 18 a 35 anos; 75,02 % dos presos cometeram crimes contra o patrimônio ou tráfico e apenas 19,36% dos presos estão em atividades de laborterapia.

 

Certo, portanto, depois da publicação deste relatório, que se o Estado Brasileiro cumprisse com suas obrigações em relação aos cidadãos e se os bancos fossem obrigados a resolver, em sua própria estrutura, grande parte dos problemas que causam (por exemplo, 90% das reclamações dos correntistas), o Judiciário Brasileiro teria condições de olhar para quem mais necessita de Justiça neste país: os pobres e excluídos.

 

Por fim, há momentos em que sinto uma terrível dificuldade em defender esta tal de “segurança jurídica”, o famoso “Estado Democrático de Direito” e a legitimidade do Poder Judiciário para distribuir a Justiça e manter a paz social neste país. Parece, como diz Caetano Veloso, que “alguma coisa está fora da ordem...”

*Gerivaldo Alves Neiva é Juiz de Direito no Estado da Bahia

24 avril 2011

O duelo entre a vida e morte

 

Por Leonardo Boff *
 
Num dos mais belos hinos da liturgia cristã da Páscoa, que nos vem do século XIII, se canta que "a vida e a morte travaram um duelo; o Senhor da vida foi morto mas eis que agora reina vivo”. É o sentido cristão da Páscoa: a inversão dos termos do embate. O que parecia derrota era, na verdade, uma estratégia para vencer o vencedor, quer dizer a morte. Por isso, a grama não cresceu sobre a sepultura de Jesus. Ressuscitado, garantiu a supremacia da vida.

A mensagem vem do campo religioso que se inscreve no humano mais profundo, mas seu significado não se restringe a ele. Ganha uma relevância universal, especialmente, nos dias atuais, em que se trava física e realmente um duelo entre a vida e a morte. Esse duelo se realiza em todas as frentes e tem como campo de batalha o planeta inteiro, envolvendo toda a comunidade de vida e toda a humanidade.

Isso ocorre porque, tardiamente, nos estamos dando conta de que o estilo de vida que escolhemos nos últimos séculos, implica uma verdadeira guerra total contra a Terra. No afã de buscar riqueza, aumentar o consumo indiscriminado (63% do PIB norte-americano é constituído pelo consumo que se transformou numa real cultura consumista) estão sendo pilhados todos os recursos e serviços possíveis da Mãe Terra.

Nos últimos tempos, cresceu a consciência coletiva de que se está travando um verdadeiro duelo entre os mecanismo naturais da vida e os mecanismos artificiais de morte deslanchados por nosso sistema de habitar, produzir, consumir e tratar os dejetos. As primeiras vítimas desta guerra total são os próprios seres humanos. Grande parte vive com insuficiência de meios de vida, favelizada e superexplorada em sua força de trabalho. O que de sofrimento, frustração e humilhação ai se esconde é inenarrável. Vivemos tempos de nova barbárie, denunciada por vários pensadores mundiais, como recentemente por Tsvetan Todorov em seu livro O medo dos bárbaros (2008). Estas realidades que realmente contam porque nos fazem humanos ou cruéis, não entram nos calculos dos lucros de nenhuma empresa e não são considerados pelo PIB dos países, à exceção do Butão que estabeleceu o Indice de Felicidade Interna de seu povo. As outras vítimas são todos os ecossistemas, a biodiversidade e o planeta Terra como um todo.

Recentemente, o prêmio Nobel em economia, Paul Krugmann, revelava que 400 famílias norte-americanas detinham sozinhas mais renda que 46% da população trabalhadora estadunidense. Esta riqueza não cai do céu. É feita através de estratégias de acumulação que incluem trapaças, superespeculação financeira e roubo puro e simples do fruto do trabalho de milhões.

Para o sistema vigente e devemos dizê-lo com todas as letras, a acumulação ilimitada de ganhos é tida como inteligência, a rapinagem de recursos públicos e naturais como destreza, a fraude como habilidade, a corrupção como sagacidade e a exploração desenfreada como sabedoria gerencial. É o triunfo da morte. Será que nesse duelo ela levará a melhor?

O que podemos dizer com toda a certeza que nessa guerra não temos nenhuma chance de ganhar da Terra. Ela existiu sem nós e pode continuar sem nós. Nós sim precisamos dela. O sistema dentro do qual vivemos é de uma espantosa irracionalidade, própria de seres realmente dementes.

Analistas da pegada ecológica global da Terra, devido à conjunção das muitas crises existentes, nos advertem que poderemos conhecer, para tempos não muito distantes, tragédias ecológico-humanitárias de extrema gravidade.

É neste contexto sombrio que cabe atualizar e escutar a mensagem da Páscoa. Possivelmente não escaparemos de uma dolorosa sexta-feira santa. Mas depois virá a ressurreição. A Terra e a Humanidade ainda viverão.

 

* Leonardo Boff é teólogo, filósofo e escritor.

 Fonte: Adital

22 avril 2011

Eficiência x Normatividade - juízes sobre o fio da navalha?

                                                                                   

 Toscano__3_É bem verdade que o serviço público precisa se aprimorar e melhor utilizar seus recursos, e que a democratização do acesso à Justiça passa, inexoravelmente, por um"input" e um "output" relativamente equilibrados, bem como temos boa vontade em buscar mais eficiência na nossa atuação. Contudo, temos visto se falar muito em números, enquanto uma recente pesquisa (IPEA) alertou que, passados mais de 6 anos da Reforma do Judiciário, a insatisfação da população com o Judiciário continua sendo a mesma. Agora se fala mais em perda de qualidade.

Não sou refratário à eficiência. Cumpri todas as metas e reduzi o acervo de processos da Vara em que sou titular, desde que assumi, há dois anos e meio, a menos de 1/3 do que recebi. Preocupam-me, isto sim, os limites desse caminhar. Preocupa-me a crescente contaminação do Judiciário pelo discurso econômico neoliberal. Não para menos, a palavra do dia é eficiência, como se fosse ela a pedra de torque da atuação do Judiciário, e não a guarda da Constituição, dos direitos fundamentais, enfim, das regras do jogo democrático. Números impressionam os incautos. Por trás, vejo eu, está ocorrendo um processo de hierarquização, de concentração de poderes nos tribunais superiores. Vou explicar.

Preocupa-me quando o Conselho Nacional de Justiça publica uma resolução estabelecendo como critério para promoção, “o respeito às súmulas do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais Superiores” (Resolução 106).

Loas aos eficientes e às metas, mas que para isso não tenhamos que nos despir da toga para nos tornarmos, finalmente, “administradores”, gerentes de um entreposto judiciário. Não podemos nos transformar em “operários do direito”, no seu sentido maquinal e autômato, agindo a serviço da matriz, que nos manda, por meio de enunciados (vinculantes ou não), as diretrizes expressando quais são os limites epistemológicos. Reconhecer a falibilidade dos tribunais superiores e sempre fazer a adequação da decisão à Constituição? Isso não nos pertence mais?

Preocupa-me quando, há não muito tempo, um então presidente do STF criticou o que chamou de “independentismo” da magistratura de primeiro grau, como se ter uma postura independente fosse algo reprovável. Mas o juiz não é independente, é verdade. Ele tem um senhor: a Constituição. No mais, supremos ou não, juízes erram, tribunais erram igualmente.

Assim, caminhamos sobre o fio da navalha. Dosar a eficiência com a real e necessária independência funcional, com um julgamento em que se realize uma reflexão além da mera reprodução de precedentes de tribunais superiores, repercussões gerais e súmulas.

Entendo que não haverá o aprimoramento do Judiciário sem sua democratização, sem a eleição dos dirigentes pelas bases, em todas as esferas, diga-se de passagem.

Mas já que isso não é visível no horizonte, compete a nós identificarmos que o discurso da eficiência, quando levado ao extremo, pode esconder um processo de hierarquização e fragilização da magistratura em benefício da cúpula. Nenhuma concentração de poder é boa para a democracia e para a sociedade. Assim, cientes dessa realidade, poderemos nos debruçar sobre os autos e bem dosar um julgamento eficiente, mas que respeite a normatividade e a singularidade de cada caso.

*Rosivaldo Toscano Jr. é Juiz de Direito no Rio Grande do Norte e membro da Associação Juízes para a Democracia - AJD

Fonte: Blog de Rosivaldo Toscano Jr. Direito, Sociedade e Pós-modernidade

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22 avril 2011

Wikileaks: o saque do petróleo no Iraque

 Por Altamiro Borges*                                                        

 OILWARDocumentos vazados pelo WikiLeaks nesta terça-feira (19) comprovam, mais uma vez, que a "guerra" no Iraque foi uma grande farsa - tramada pelas potências capitalistas e amplificada pela mídia corporativa.

Eles mostram que o governo britânico, em conluio com o dos EUA, discutiu a partilha do petróleo do país invadido um ano antes da invasão. A história da existência de armas de destruição em massa foi mais uma mentira abjeta e descarada das nações imperialistas.

Partilha combinada um ano antes

Conforme notícia publicada no jornal inglês The Independent, os documentos vazados pelo WikiLeaks revelam que "os planos para exportar as reservas de petróleo do Iraque foram discutidos por ministros do governo britânio e as principais petroleiras internacionais um ano antes da Grã-Bretanha aceitar, junto com os Estados Unidos, invadir o solo iraquiano".

 O jornal lembra que a grave denúncia sobre a existência do plano prévio já havia sido feita em março de 2003. Na época, tanto Shell com a BP negaram que tivessem se reunindo às escondidas em Downing Street, sede do governo britânico, para discutir a partilha do petróleo. O primeiro-ministro na época, o capacho Tony Blair, também qualificou as denúncias de "totalmente absurdas".

Saqueadores e criminosos

Agora, porém, os documentos vazados pelo WikiLeaks confirmam a trama e desmascaram os mentirosos - que deveriam ser processados pela morte de milhares de pessoas no Iraque. Os memorandos publicados no The Independent, datados de outubro e novembro de 2002, dão detalhes sobre as reuniões.

Num deles, de cinco meses antes da invasão, Elizabeth Symons, ministra de Comércio, afirma à BP que o governo queria que as companhias energéticas britânicas recebessem parte dos enormes benefícios do petróleo e do gás do Iraque como recompensa pela ajuda militar dada por Blair aos Estados Unidos para a mudança do regime iraquiano.

*Altamiro Borges é jornalista e escritor; também é um dos dirigentes do Comitê Nacional do Partido  Comunista do Brasil - PC do B.  O Companheiro vive em São Paulo, capital.

Fonte: Blog do Miro

21 avril 2011

Uma democracia não se consolida com cadáveres insepultos

(Reproduzimos artigo assinado por Desembargador gaúcho, publicado, ontem, na pag. 04 do jornal O Sul.  É nossa forma de saudar esta data magna de 21 de abril, reverenciando a memória de todos os heróis da Pátria, na figura do maior Mártir do Brasil, Tiradentes)

bandeira_minas

 

" Uma democracia não se consolida com cadáveres insepultos

 

O Ministério da Justiça publicou, no dia 5 de abril, a portaria nº 417, que pretende facilitar o acesso a determinados documentos relacionados ao regime militar.

 

É notório na história recente do Brasil que, desde a edição dc AI-5, em 13 de dezembro de 1968, e do decreto-lei nº 447/1969, e sob as suas sombras, se praticaram as maiores arbitrariedades a repercutir intensamente nos direitos dos cidadãos (e seus familiares) que se viram inteiramente desprotegidos e submetidos a uma onda de repressão até então nunca vista. Os esquadrões da morte, desde 1968, eliminaram um número até hoje desconhecido de pessoas. A esse número somam-se os extermínios efetuados pelo aparelhamento policial em nome da segurança e do restabelecimento da ordem.

 

Em meio a tudo isto, as alterações levadas a efeito no texto constitucional e na edição de determinadas leis, como, dentre outras, as já citadas Lei de Imprensa, a Lei Antigreve, a Lei de Segurança Nacional, o Estatuto do Estrangeiro, foram efetivadas para que o sistema encontrasse sua sustentação formal e ficcional, transformando muitas instituições públicas como que gestoras do terror de Estado, reivindicando para si o monopólio do exercício ilegítimo da violência. O Estado foi manejado como se fosse um objeto particular, alheio a qualquer finalidade pública, perdendo-se em uma crise de identidade sem predecentes.

 

O governo da época conseguiu, com tais comportamentos, criar o anti-Estado, gerido por iniciativas políticas arbitrarias cada vez mais intensas de alguns comandantes das forças públicas; é o surgimento paradoxal do Estado bandido, blindando ações de tamanha violência física e simbólica referidos com vestes de legalidade formal, e operando com a lógica da disseminação do medo para desmobilizar a sociedade.

 

Por sua vez, o controle jurisdicional sobre os abusos cometidos pelas forças do sistema foi marcado – com algumas exceções – pelas limitações impostas pelo próprio texto constitucional e pela ideologia conservadora de uma parte dos juristas brasileiros. Tanto é verdade que o estudo levado a cabo pelo movimento “Brasil: Nunca Mais” registra que dos 6.385 indiciados em processos militares consultados, presos e torturados, apenas 1,4% dos casos foram comunicados regularmente à autoridade judicial.

 

Na via inversa, o Ministério da Justiça publicou, no dia 5 de abril, a portaria nº 417, que pretende facilitar o acesso a determinados documentos relacionados ao regime militar, do Sistema Nacional de Informação e Contra-informação, em especial referente aos anos de 1964 e 1985, sob a guarda do Arquivo Nacional. Tal gesto talvez contribua na avaliação mais refletida que se tenha de fazer sobre os termos restritivos de acesso a este tipo de informação construídos pelo Lei Federal nº 8.159/91, e posterior Lei Federal nº 11.111/2005, ambas criando dificuldades temporais longínquas de abertura dos arquivos secretos do regime de exceção.

 

Este é mais um passo em direção a restauração da verdade e memória, fortalecendo as condições normativas e políticas para que se avance ainda para além das torres blindadas dos segredos daquele anti-Estado, em direção ao mundão que heróicas senhoras vislumbraram em antigo prédio em que se instalara o Presídio Tiradentes, em São Paulo, presas pela ditadura militar.

Talvez aquelas donzelas da torre tenham sido mais do que visionárias na resistência, eis que a maior parte das sobreviventes fez valer a pena o mundão que hoje nós vivemos, mas há muito ainda o que recordar e recuperar , principalmente o que já fora silenciado faltamente, pois, como já disse uma delas, uma democracia não se consolida com cadáveres insepultos.

 

Rogério Gesta Leal

Desembargador do TJ/RS"

******************

Os editores do blog convidam: Assista ao Hino, acompanhado de magníficas imagens, em homenagem ao evento maior da nossa brasilidade, a Independência, por que nosso herói dedicou sua existência e, ao final, deixou em oferenda sua própria vida no altar da Pátria.

 

Salve Tiradentes!                                                 

 

20 avril 2011

Servidora com experiência de sindicalista em Minas critica veementemente a atitude da Direção do Sindjus

Reproduzimos abaixo, com a autorização da autora, e-mail encaminhado pela companheira Vilma Medina, da 8.ª Vara da Fazenda pública, de Porto Alegre, à direção do Sindjus-RS, na última quarta-feira, 13 de abril:

 "Prezados Senhores:


Por meio deste, venho manifestar a minha decepção e minha tristeza com a atuação desse Sindicato. Sou escrivã da 8ª Vara da Fazenda Pública, sindicalizada, ex presidente do Sindicato dos trabalhadores em armazéns e silos do estado de Minas Gerais, ex advogada.

A minha inconformidade tem base no seguinte:

1) quando uma categoria não tem data-base garantida, como a nossa, a data para mobilizá-la e fazer campanha salarial (apresentando o índice de reajuste do ano) é no máximo até o mês de julho, antes do envio do Planejamento Orçamentário do ano. Pois bem, no ano de 2010 o Sindijus não fez essa mobilização e o Tribunal de Justiça mandou para a Assembléia a previsão de reajuste para os servidores do Poder Judiciário em 5% (cinco por cento);

2) Agora, depois que os servidores começaram a mandar e-mail cobrando o reajuste (eu inclusive mandei e não obtive resposta), o Sindicato arma toda essa panacéia para enganar os pobres dos servidores falando em apresentar uma proposta de 27%. Sabem quando seremos atendidos? NUNCA! Ganharemos 5% e se o Presidente Leo Lima conseguir que esse percentual aumente, esperem que virá tirado em alguma outra vantagem uma lasquinha para compensar. Já viram patrão dar algo de graça para trabalhador? Eu nunca vi.

3) Se a nossa perda salarial foi de mais de 50% por quê estamos apresentando uma proposta de 27%? Perda é perda e não deve ser negociada. PERDA TEM QUE VOLTAR PARA O SALÁRIO BASE RE-DON-DO. Sindicato pelego, que come na mão de patrão é que negocia perda.

Portanto, colegas:

1) Não coloque os pobres servidores neste momento para paralizar por uma hora, para comparecer em assembléias, etc, etc, porque o Sindicato perdeu o prazo de fazer isso: Foi. Passou. Já era. Qualquer coisa a mais de 5% será um favor do Presidente do TJ e qualquer mobilização agora será motivo de chacota por parte dos nossos superiores. Não humilhe mais os servidores, por favor.

2) Não engane mais uma categoria tão sofrida e depalperada pelas condições péssimas de trabalho e de salário. Olha, na última assembléia eu ouvi colegas dizendo que têm 30 anos de Poder Judiciário e desde que entraram esperam e ouvem falar no Plano de Carreira. Vi pessoas velhinhas que vieram do interior - andando de bengalas e senti pena daquelas pessoas. TODOS ENGANADOS.

3) Eu tenho apenas 3 anos de Poder Judiciário e não acredito nessa panacéia. O Sindjus não está preparado para fazer campanha salarial - perde prazo e não sabe "peitar" o patrão para exigir. Eu mereço um Sindicato melhor: que me garanta logo de início uma data-base, que passe o ano focado no reajuste anual sem perder o bonde e sem ter que ficar enganando os servidores, fazendo-os de bobos para tapear um erro crasso: PERDA DE PRAZO.

4) Por tudo isso, requeiro a minha desfiliação: não vou trabalhar feito louca (quase 62 mil processos divididos por 5 servidores e uma escrivã) para dar no final do mês 1% do meu sagrado salário para quem não sabe me representar. Espero que os colegas reflitam e transforme essa mobilização de agora para a campanha salarial deste ano, 2011 para entrar no orçamento de 2012. JÁ BASTA A VERGONHA DO REAJUSTE DO ANO PASSADO: 4,75 DIVIDO EM TRÊS PARCELAS. Não paguem esse mico e nos respeitem, por favor!

Vilma Medina"

18 avril 2011

Primavera de abril floresce na mobilização dos trabalhadores da justiça gaúcha

Contra todas as expectativas dos sindicalistas tradicionais, a onda de consciência, indignação e mobilização dos trabalhadores da justiça, iniciada com a carta da Comarca de Planalto, não arrefeceu após a Assembléia Geral de 8 abril, explodindo num vertiginoso crescimento de solidariedade, auto-organização, entusiasmo e exigência.


flores_2222O que se viu concretamente, no dia 13 de abril, foi muito além dos diagnósticos da direção executiva do Sindjus-RS (que, provavelmente, esperava, no máximo uma morna e burocrática paralisação em algumas comarcas) e do próprio Movimento Indignação, que temia que os mais radicalizados (decepcionados com a moderação da proposta aprovada: apenas uma hora de paralisação) recuassem e abandonassem sua disposição de ir às últimas consequências na busca de um salário que lhes permita pagar as contas e sobreviver com dignidade, bem como dos itens mais urgentes e importantes da pauta de reivindicações (plano de carreira decente, carga horária diária de 7 horas contínuas e pagamento dos valores efetivamente devidos nos atrasados dos juros da URV).

Em plena quarta-feira, na primeira hora da tarde, era possível contar nos dedos (se muito) as comarcas que não haviam paralisado, a maioria com 100% de seus funcionários. E o seu entusiasmo e mobilização ía muito além do chamamento dos diversos grupos políticos que disputam a liderança do movimento no interior do sindicato (da direção a antigos membros da gestão 2004-2007, cuja postura se equilibrava entre o oportunismo oposicionista e o temor de bater de frente com a situação). As comarcas, seguindo os exemplos de Planalto, Canguçu, São Gabriel, Santa Rosa, Sarandi e outras, passaram simplesmente a lançar, cada uma, suas próprias cartas de reivindicação e exposição das mazelas sofridas, bem como a se comunicar entre si, debatendo, criticando e se incentivando mutuamente, independentemente da direção do Sindjus (ou da oposição), através da Internet.

Durante os três últimos dias da semana passada, os e-mails setoriais8674vermelhas dos cartórios do Estado afora simplesmente se viram abarrotados pela movimentação dos servidores, num crescente de troca de informações e mobilização que traduz uma vontade inquebrantável de não ceder um milímetro de seus direitos e uma tomada de consciência espontânea nunca vista desde a fundação do sindicato (1988) e das greves históricas de 1987 e 1995. Do conteúdo das diferentes mensagens é possível constatar-se que a categoria tomou plena consciência de vez de que o Judiciário só se movimenta graças ao seu sacrifício e de que o Tribunal não lhe dá o menor reconhecimento por isto, priorizando o atendimentos dos privilégios cada vez maiores da magistratura. Neste cenário, dificilmente a massa de servidores se deixará enganar novamente, como ocorreu no ano passado, aceitando cabisbaixa uma proposta ínfima e insuficiente de reposição salarial, sob a influência da direção sindical, acolherada com o patrão.

CATEGORIA FORÇA DIREÇÃO DO SINDJUS A CUMPRIR DECISÃO SOBERANA - Exemplo da autonomia, coragem e firmeza adquirida nos últimos foi o episódio envolvendo a proposta de entrar com MANDADO DE INJUNÇÃO deliberada na Assembléia Geral, por maioria, contra a vontade da direção do Sindjus, que se opunha por ranço ideológico.

Apesar de aprovada por ampla maioria, a direção do Sindjus simplesmente omitiu-a ao divulgar as deliberações tomadas no dia 8. A Autora da proposta, a companheira Dionara, de Sapucaia do Sul, indignada, abriu, então, corrente pela internet exigindo o cumprimento da proposta aprovada e, diante das dezenas de manifestações das comarcas ameçando responsabilizar os dirigentes (que se viram às portas de serem destituídos), a Executiva do Sindjus se viu obrigada, pela pressão dos servidores, a divulgar, com um sorriso amarelo, notícia no site da entidade, na última sexta-feira, dando conta de que "a proposta não havia sido divulgada por engano" e de que a Assessoria Jurídica já se encontrava trabalhando nela desde a Assembléia Geral.

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 MÁXIMA FIRMEZA E ATENÇÃO NESTE MOMENTO - A direção do Sindicato, sentindo o ânimo da categoria, já desistiu de fincar pé na realização de simples reunião de representantes para avaliar a futura proposta salarial do patrão - em que pretendia, provavelmente, facilitar, numa instância restrita, a aprovação boca abaixo da migalha oferecida pelo Tribunal, como no ano passado).

 Agora nossos caros líderes sindicais já falam em Assembléia Geral, porque sabem que a massa dos trabalhadores não aceitará outra hipótese.

Mas é necessário ficarmos de olhos bem abertos, pés bem firmes e fincados no chão. Porque qualquer proposta que não garanta recuperação imediata dos 27%, a certeza legal da reposição da inflação futura a cada ano, a partir de agora, e a reposição do restante em, no máximo, um ano (em duas parcelas semestrais e não a longo prazo num plano de carreira incerto), simplesmente perpetuará o esquema de reposições parciais e insuficientes que nos trouxe à dramática situação atual.

Se hoje não conseguimos nem dormir, atormentados pelo cheque especial estourado, empréstimos consignados e uma série de financiamentos que corroem nossos bolsos, se tornando impagáveis, é porque o Tribunal, nas últimas duas décadas sempre nos concedeu reajustes abaixo do necessário e quando bem entendeu, para poder dar prioridade aos privilégios da magistratura. Se passamos um inferno em vida, nos esfalfando para dar conta da falta de servidores (mais de 1800 vagas só para completar o quadro legal já defasado), e apesar disto, com o nosso sangue e saúde, garantindo a medalha de melhor judiciário do Brasil para os nossos patrões, sem qualquer recompensa, é porque não tínhamos, até ontem, coragem e firmeza para ir às últimas consequencias em busca de condições salariais e de trabalho dignas.

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Portanto, é preciso ser firme, e, diante de qualquer colorida e florida contraproposta ridícula de 11%, sem qualquer garantia de reposição anual futura e reposição do restante da perda em prazo certo, dar um FORTE E SONORO NÃO. Indo mesmo à GREVE, se necessário, para que não continuemos a viver uma vida de cão até a aposentadoria, na esperança de um reconhecimento que, conforme a grande massa já percebeu, JAMAIS CHEGARÁ ATÉ NOS FAZERMOS RESPEITAR PELO TRIBUNAL!

Se vier a proposta menor do que o pedido, mas com ares de remediar a situação, de 11% ou 12%, é porque há dinheiro no orçamento e porque o patrão percebeu que estamos dispostos a ir a luta de formas mais fortes por reajuste. E aí é preciso aproveitar e não perder a oportunidade, deixando-se encantar por aquela migalha que até resolverá um pouco o problema hoje, mas no final do ano, com a elevação do IGPM que vem ocorrendo ultimamente, não estará representando mais nada.

VAMOS, PORTANTO, PROSSEGUIR COM TODA A FORÇA E FIRMEZA, PORQUE JÁ PROVAMOS A NÓS MESMOS, SERVIDORES SOFRIDOS E DESENCANTADOS, NESTA PRIMAVERA DE ABRIL, QUE É POSSÍVEL, ROMPER COM A ETERNA ROTINA DA DESGRAÇA, ERGUER NOSSO BRADO E CONQUISTAR UM MÍNIMO DE DIGNIDADE, QUANDO TOMAMOS CORAGEM E CONSCIÊNCIA DA NOSSA FORÇA!

Movimento
   Indignação

16 avril 2011

Das virtudes da vadiagem

O título é irônico e provocativo. Mas se trata de ensaio teórico escrito por nosso membro Ubirajara Passos, publicado em outubro de 2006, em seu blog pessoal, que analisa a fundo, questionando as crenças mais inocentes e estabelecidos, o quotidiano de gado dos trabalhadores em geral:

                                  Não fôssemos animais infelicitados por um cérebro capaz de ir muito além do conhecimento imediato e imergir nos mais refinados recantos do universo da possibilidade e da emoção, e o trabalho poderia justificar-se como uma “razão de viver” e não a tortura inevitável que a necessidade física da sobrevivência, e da existência em um mundo feito de matéria, nos impõe. Muito ao contrário da pregação hipócrita de seus maiores defensores (bons burgueses seríssimos, de veias túrgidas de gordura, que construíram suas vidas no árduo e austero “trabalho” de amealhar fortuna à custa do trabalho alheio, ou recalcados líderes de “esquerda”, contaminados pelo moralismo das sacristias), o embrutecedor e massacrante labor nada possui de virtuoso, dignificante ou realizador! É antes um entrave a seres forjados, pela condição que lhes deu a evolução biológica, para o prazer e a aventura e não para a insípida e tediosa rotina de autômatos de carne e osso. 

Seja, porém, pela necessidade de fugir ao suplício da faina diária e recuperar, ainda que abastardado, o paraíso do prazer (só alcançável no mais genuíno e absoluto ócio), seja pelo deleite especial que lhes proporciona o exercício do sadismo, os mais aguerridos e astutos dentre nós arrojaram-nos, historicamente, a obrigação de não apenas mourejar contínua e dolorosamente por nossa própria vida, mas também pela deles, sob cuja prioridade passamos a existir. 

                            Não bastasse, portanto, o séquito natural de incômodos decorrentes da atividade necessária, rotineira e, intelectual e emocionalmente, limitada e aborrecida (como o afã doméstico) que nos inflige a nossa própria condição mortal individual, o advento da dominação (na forma das correntes físicas da escravidão ou institucionais e ideológicas da servidão e do emprego) transformou o que era um purgatório inarredável no mais completo e exasperante inferno! Se o trabalho “livre” guarda ainda alguma possibilidade de prazer , conforme a solicitação intelectual ou estética nele envolvida (um artesão de marcenaria ou um oleiro poderá apaixonar-se pelas “obras de arte” que produz no seu torno), o exercido sob as patas do patrão elimina qualquer possibilidade de manifestação autêntica da personalidade e acaba por condicionar todo o restante de nossas vidas.

O mais dramático, no entanto, não é o embrutecimento inevitável presente na lida, mas o fato de que, não trabalhando, colocamos em risco a nossa própria sobrevivência física. Deitar-se, permanentemente, à rede, meditando sob os insondáveis desígnios e mistérios da alma humana e da vida, e apreciar o instigante desfile da luz, da brisa e do luar, pode se constituir num convite certo à morte... ao menos que pertençamos à classe daqueles que obrigam os demais a não ter um único momento para contemplar o encanto de quadris bamboleantes, absortos na severa “diversão” de se esbodegar pelo patrão.

É este caráter categoricamente indispensável do trabalho que cria a possibilidade (mesmo numa sociedade em que a tecnologia avançadíssima poderia nos aproximar a todos do Éden – reduzindo ao mínimo necessário o tempo e a natureza penosa da ocupação) de submetermo-nos à incessante rotina de humilhação, cansaço, imbecilidade e obediência cega e reverente diante dos mais vaidosos e burros feitores que executam a vontade dos nossos “senhores”.

A divisão do trabalho, o irracionalismo “lógico” da produção em série, ou a “necessidade” de atendimento eficaz e célere da demanda de serviços, nos transformam em zumbis, mais inconscientes do que as próprias máquinas operadas ou as rotinas formais dos procedimentos de escritório. Mas, muito além da inerente despersonalização por eles imposta, é a disciplina, fria e regulamentadora, da “ética laboral” a causa mais profunda, e onipresente nos vários ramos da atividade humana considerada “útil”, dos tormentos na luta pelo pão que o diabo (ou Deus?) amassou de cada dia.

Não há maior infelicidade para um ser pensante e sensível do que, além de ter negado o prazer e o mínimo de condições materiais de existência em nome do luxo e do capricho alheio, ser submetido, durante a maior parte de sua vida desperta, a atuar não segundo as inspirações e motivações da inteligência e da emoção próprias, mas ter de jungir-se à formalidade e à vigilância contínuas de regras o mais das vezes irracionais e profundamente impregnadas do maior carrancismo e moralismo autoritário, dignos dos mais inveterados mestres-escolas, de palmatória em punho, dos tempos dos nossos avós.

Se a exigência de “bom-comportamento” e austera seriedade está presente, mesmo sob a tênue capa da tolerância “informal” da modernidade, em cada instância de nossas vidas (do trânsito ao leito, passando pela escola e até pelo bordel) é no trabalho que ela, pela necessidade de submissão total que a dominação pressupõe, atinge o seu ápice.

O desconforto, o sofrimento físico e psicológico do homem transmutado em coisa, aferrado a ações automáticas, repetitivas (e, portanto, cansativas), fastidiosas e obnubilantes não são apenas uma conseqüência lógica das modernas formas e “imperativos” da produção, num mundo de complexidade tecnológica crescente, mas um componente ideológico necessário ao exercício do domínio. Não é possível obrigar um indivíduo a todo este sacrifício e degradação voluntários, senão imbuindo-lhe até a menor molécula do senso absurdo de auto-imolação, do dever de “ser útil” ou, pelo menos, do temor (reforçado pelo comportamento delatório e oportunista dos demais membros do rebanho) da autoridade e suas imposições de estrita e sisuda dedicação ao serviço (um cigarro ou uma gargalhada são um tempo “subtraído” imoralmente ao amo que alugou-lhe os braços ou a mente, assim como a menor satisfação pode trazer à tona o desejo de jogo, prazer e liberdade sepultados).

A exploração e o domínio carecem da sujeição do animal humano a cangas, encilhas e bretes tão violentadores, que esta se faz, forçosamente, presente não apenas no espaço exclusivo do lavor, sob pena de se esfacelar. Assim, a alimentação, o sexo, o lazer (a vadiagem institucionalizada), os mínimos momentos, peripécias e detalhes que formam o estofo dos nosso dias passam, imperceptivelmente, a ter “horários”, conteúdo, e mesmo formas de exercício, regrados e definidos não segundo as necessidades biológicas naturais ou as inspirações emocionais e decisões do nosso arbítrio individual, mas conforme as contingências do lucro que propicia a vida faustosa e sem sobressaltos de nossos amos.

Outro não é o cenário no qual o que sobra das horas dedicadas aos afazeres mal se presta às rotineiras atividades necessárias à manutenção da existência do rebanho de trabalhadores. Se examinarmos atentamente o tempo “livre” de que dispomos, constataremos que (quando o parco salário nos permite e a fadiga da jornada não nos converte em abúlicos adoradores dos deuses eletrônicos – rádio e televisão) nele nos resta uma atabalhoada luta contra o tempo limitado, destinado às compras, ao estudo, ao cumprimento protocolar e frio dos papéis familiares e sociais e, quando muito, ao divertimento insulso dos fins-de-semana periódicos. Uma existência mecanizada, em que se destina um tempo e um local obrigatórios para cada atividade, ainda que em flagrante contradição com as condições emocionais ou físicas do momento. Em que os sentimentos e interesses mais caros e profundos não podem, nem devem, segundo a ética vigente, manifestar-se a qualquer instante, mas subordinam-se e são sacrificados aos sagrados reclamos do trabalho. A própria folga da trabalhadora grávida, sob o título de licença-maternidade, caracteriza uma exceção que a produção econômica, assumindo a primazia, concede à natureza para continuar a perpetuar a vida!

Não é, entretanto, por não haver fuga possível (sem prejuízo da vida ou de um mínimo de dignidade humana) ao trabalho, que devemos nos sujeitar ao controle inelutável e doloroso da atividade assalariada, nem à interdição constante, em seu nome, dos deleites proporcionáveis por nossos corpos, emoções e intelecto. Não é, em suma, por ser um mal necessário que devemos organizar, e permitir que organizem, nossas vidas no interesse do trabalho, ao invés de trabalhar, o mínimo necessário e com a máxima liberdade e satisfação própria de seres dotados de razão e sensibilidade, para vivermos de forma válida e agradável.

Ubirajara Passos

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Um blog para lutar em defesa dos Servidores da Justiça do Rio Grande do Sul. Os autores propugnam pelos princípios republicanos; almejam uma sociedade justa

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