Com a postergação da greve na fatídica Assembléia de 20 de maio (contraditoriamente a maior da história dos trabalhadores da justiça gaúcha), as flores da primavera de abril começaram a perder o viço e parecem ameaçar murchar definitivamente.
Se até então, a consciência e a combatividade da categoria pareciam crescer dia a dia, se uma voz praticamente unânime se elevava desde as menores comarcas até Porto Alegre, exigindo aos brados a reparação das condições salariais e funcionais injustas de que somos vítimas (a ponto de mesmo os mais acomodados e conservadores acreditarem que a greve era iminente e seria deflagrada naquela data), de lá para cá o cenário (perfeitamente espelhado no e-mail setorial) é de uma dissonância e uma perplexidade inacreditáveis. E escapa mesmo à saudável e natural divergência do debate público.
Há desde os que (legitimamente revoltados com a direção do Sindjus) pregam a desfiliação do sindicato aos que (também legitimamente desiludidos com a atitude da massa presente na Assembléia Geral) não se conformam com as paralisações de 1 dia por semana e crêem que perdeu-se a ocasião ímpar de deflagrar a greve, não vendo mais nenhuma perspectiva pela frente.
Muitos, como nós, defendem a antecipação da próxima Assembléia Geral para, no máximo, o próximo dia 10, e crêem que ainda há força e ânimo (mesmo morno, como brasa adormecida, que só espera um leve sopro pra sacudir as cinzas e transformar-se novamente em fogaréu) para constituição da greve. E outros tantos (entre eles, equivocados grupos de oposição independente) insistem na continuidade desgastante e agonizante das paralisações semanais até o fim da primeira quinzena de junho.
São posturas, até certo ponto, teroricamente admissíveis e passíveis de consideração – não fosse a sua variedade e o tempo demasiado porque se prolongam, sem desembocar num meio termo ou numa hegemonia que congregue o entusiasmo da categoria.
Mas, certamente, o que não se admite é o engano de muitos companheiros (cujo número ainda que não majoritário é preocupante) que, diante da recusa reiterada do Tribunal em atender a reivindicação salarial (enviando ao parlamento a esmola de 12% parcelados e teimando, em ofício recentemente publicado pelo Sindjus-RS, em não conceceder nada além), simplesmente se deixam abater pelo desânimo e admitem aceitar a migalha, abrindo mão do restante das perdas históricas – ainda que com a desculpa esfarrapada e impraticável de “aceitar o que já está certo e depois lutar pelo restante” .
Por mais racional e fria, realista e “responsável” que possa parecer esta opção, ela implica simplesmente na extinção da mobilização, na perda vergonhosa da auto-estima e da dignidade reconquistadas, com uma espontaneidade e força incríveis, durante as mobilizações de abril, e no acomodamento conformado e sem brio às imposições maquiavélicas e opressoras de um patrão insensível e injusto e à falta de combatividade e compromisso de uma direção sindical pusilânime e balbuciante.
Quem não sabe, em sã consciência, que, aprovado o projeto de 12%, com a aceitação da categoria, se tornará inviável (tanto pela conformidade dos trabalhadores, quanto pela rejeição do próprio Judiciário, e especialmente do Executivo) a discussão e encaminhamento de novo projeto que contemple as demais perdas salariais ainda este ano? A categoria estará exausta de uma luta mal sucedida e a cúpula dos 3 poderes do estará com toda a energia para recusar-se a conceder novas reposições, sob o pretexto cretino de que o máximo já foi dado e a ocasião de discuti-las é o próximo exercício fiscal.
Mesmo os demais itens da pauta de reivindicação (jornada de 7 horas e plano de carreira digno e humano) dificilmente entusiasmarão a própria categoria e acabarão relegados ao embate inócuo e inofensivo dos abaixo-assinados, das negociações de bastidor e pressões de lobby formal e cordado
Não há como se iludir (ao menos que não se tenha coragem de admitir a traição dos próprios princípios e de todo esforço que se fez no presente ano). Aceitar os 12% significa abrir mão não só da reposição imediata da metade das perdas históricas, mas também do seu restante. E (mesmo que o patrão acene, burocraticamente, com a tramitação a seu respeito, sem se comprometer de forma concreta) até da própria política salarial de recuperação integral da inflação anual. Que os diretores do Sindjus insistem em confundir com a noção de data-base, simples dia fixo no ano para se negociar salário, chegando ao ponto, na última publicação, de falar em “negociação das perdas anuais”, quando estas devem ser integralmente repostas, conforme manda o art. 37, X da Constituição Federal – o que se negocia, mas não se abre mão, são as perdas historicas eventuais, e mesmo eventuais aumento reais, além da inflação!
Compreendemos plenamente que a desaceleração e a perplexidade que está tomando conta do movimento, ao ponto de resultar em posturas como esta, é resultado direto do cansaço, da postergação indefinida da greve que a direção sindical inerte conseguiu impor (paralelamente ao Tribunal) aos trabalhadores da justiça, apesar de todo empenho e entusiasmo com que a maioria da categoria foi implementando as paralisações, manifestações e a própria pressão sobre a direção (levada de arrasto pela força das comarcas mobilizadas) até a última Assembléia geral.
E é natural que, passados já quase dois meses desde a Assembléia inaugural da campanha salarial, ocorrida em 08 de abril, o companheiro mais combativo, entusiasmado com a luta e inconformado com a vida de gado mal remunerado, adoecido e atabalhoado de trabalho, possível sinta arrefecer seu ânimo e comece a desesperançar.
Mas a verdade é que, após 16 anos de sono letárgico, de conformismo e apatia, esta categoria, a partir de março deste ano, e com toda força em abril e início de maio, despertou, abriu seus olhos para a vida ingrata que lhe impunham suas condições salariais e laborais, perdeu o medo, fez trovejar o brado de sua revolta e sua imensa disposição de luta sem tréguas por todo estado e se pôs a postos para exigir, a qualquer preço, os direitos mínimos que não lhe são garantidos, e que podem lhe diferenciar, a ela, composta de servidores dignos, honrados, dedicados e sofridos, de uma matilha de cães vira-latas.
comarca de Gravataí paralisada na última quarta-feira, 25 de maio de 2011
E não é possível que, no momento crucial, aquele em que o patrão fecha efetivamente as negociações mantendo, convenientemente um arremedo de diálogo parcial (promessas vagas de votação, mas não de aprovação, da jornada de 7 horas no final de junho e tramitação, sem sinal positivo de aceitação nem prazo definido, de um processo burocrático sobre data-base), com o intuito de destruir a nossa mobilização e reduzir nosso ânimo novamente a zero, para que não tenhamos a “arrogância” de voltar a exigir, com as armas eficazes e sem medo da paralisação e da quase acontecida greve, nos deixemos levar por sua truculência (que inclui já a ameaça de corte da efetividade dos dias paralisados em alguns foros regionais) e pela pouca vontade de uma direção sindical inerte e colaboracionista, e coloquemos a perder todo o esforço, e toda a consciência adquiridos até agora.
Poderemos abrir mão de direitos, até mesmo desmobilizar e voltar à rotina de sofrimento mudo e doloroso, mas as nossas próprias consciências, assim como nossos filhos, no futuro, não nos perdoarão e pagaremos o preço, cedo ou tarde, da desistência no momento-chave.
Enquanto muitos se debatem nas águas da dúvida, da evidente falta de atenção devida e ênfase da direção sindical, e outros tantos chegam a considerar, novamente, a simples e humilde recuperação, já parcelada no tempo (o que foi um erro infeliz aprovado na Assembléia geral, pois dilui a efetiva recuperação do índice histórico de 27%), de tão somente metade da defasagem inflacionária, não reposta há mais de vinte anos, como UTOPIA (!?), a realidade concreta e dura de um “auxílio-moradia” retroativo a uma década e meia, de legitimidade e ética duvidosa, auto-concedido, sem passar pelo crivo do Legislativo, e sem se submeter aos limites da “Lei de Responsabilidade Fiscal”, propicia benesses de até R$ 360.000,00 a um juiz de entrância intermediária, que se encontram há anos-luz de distância de um modesto reajuste de cerca de 800 reais (que é no que importariam os 27% para o básico de cada Escrevente de entrância igual). Enquanto alguns perdem o ânimo de prosseguir nas paralisações e chegar na própria greve, TRAMITA, CÉLERE E SEM CONTESTAÇÕES, novamente na Assembléia Legislativa, o projeto que tornará automática a reposição dos gordos subsídios da magistratura, que logo embolsarão mais 14,74%, além dos aumentos reais recebidos nos últimos anos. Para nós, entretanto, oferecem a continuidade, sem perspectiva de fim, de um arrocho de duas décadas, um plano de carreira que é antes um instrumento de opressão e aceleração da produção sem benefícios e a vaga promessa da fixação de um dia para “discutir” (mas não repor, de forma automática, como querem para seus salários) as perdas inflacionárias anuais.
Pense nisto, companheiro, antes de te deixar tomar pela desilusão, pelo esmorecimento, pela agonia de um movimento que parece não avançar, apesar de todo o empenho. E nesta data, CRUZE OS BRAÇOS, enfrente a represália e o medo, porque eles só perdem seu poder se desafiados conscientemente. Se companheiros da tua ou de outra comarca ou setor forem ameaçadas ou efetivamente "punidos" com o corte do ponto não tome isto como um motivo para te encolher e amedrontar, mas como uma injustiça inominável de um patrão a que cabe fazer a justiça e te prepare para resistir em solidariedade aos perseguidos, porque neste momento somos todos um, não há diferença entre ninguém, igualados que somos pelas mesmas condições de opressão econômica e funcional quotidiana. À repressão se deve responder com a radicalização da mobilização (a greve) até o fim de eventuais represálias e não com o acomodamento envergonhado.
E faça mais: faça a direção do Sindjus-RS ver que, definitivamente, o seu lugar é ao lado e à frente dos servidores nesta luta. Que não podemos esperar mais 3 quartas-feiras simplesmente paralisando, para deflagrar a GREVE, MAIS DO QUE NUNCA NECESSÁRIA, EM PROL DE UM MÍNIMO DE JUSTIÇA E DIGNIDADE, e que é preciso antecipar logo a próxima Assembléia Geral. Que não podemos postergar mais o conhecimento da população dos escandalosos benefícios de que goza a magistratura, enquanto padecemos, e a própria estrutura do judiciário, das mazelas mais absurdas e inadmissíveis.
Que, se nossos diretores sindicais não conseguem manter esta postura, não são dignos de seus mandatos e, sem que isto importe em nenhuma desonra, mas em coerência, devem renunciar e permitir que quem tem vontade e capacidade para conduzir de forma corajosa e instigante a luta o faça. E que é preciso, sobretudo, ter a ombridade e a sensibilidade de saber quando é o momento de radicalizar (e ele é agora, pois o próprio patrão já o fez) E NÃO DEIXAR PERDER-SE O PATRIMÔNIO DE CONSCIÊNCIA E MOBILIZAÇÃO ADQUIRIDO NESTES MESES, voltando a sofrer NUM ADORMECIMENTO ATROZ POR MAIS QUINZE OU VINTE ANOS!
movimento indignação