O Desesperado Depoimento de mais uma Vítima da Insensibilidade do Tribunal de Justiça
Recebemos ontem, via e-mail o depoimento que segue, que é paradigmático e espelha, de forma pungente as dores físicas e psicológicas de um ser humano submetido à lógica cruel da administração de pessoal fria e utilitarista do judiciário gaúcho. O Tribunal de Justiça se jacta das estatísticas de melhor justiça do Brasil, mas o real mérito da façanha pertence exclusivamente aos trabalhadores do judiciário, que se sacrificam, e mantém o atendimento à população, sem condição de trabalho e salarial nenhuma. Mas a falta de tratamento humano de seus funcionários não se restringe aos métodos em geral, em que o assédio moral tem sido a tônica. É espantoso, e apavorante, que casos concretos de absoluta necessidade de tratamento diferenciado, como o aqui exposto, sejam solenemente desprezados.
Segue o texto:
"Caros colegas da Comarca de Canguçu,
Fiquei chocada com a triste situação vivenciada por todos na tarde em que nossa colega Cláudia veio a falecer.
Compartilho com vocês a dor, a indignação e o enorme o sofrimento psicológico, que não acabaram naquele dia, após a situação ter sido resolvida (comunicação da família, etc...). Esse dia, certamente, ficará marcado na memória de todos vocês.
Entendo muito bem o que a Cláudia deve ter passado nesse período em que viveu sozinha, longe dos familiares, pois isso faz parte de minha vida, dia após dia, noite após noite.
Mesmo não estando tão distante de minha família como ela estava, é difícil, devido à nossa remuneração, que mal dá para as despesas básicas, o deslocamento até meus familiares que moram em Porto Alegre e Viamão.
Estou há 3 anos e meio aqui na Comarca (agradeço a Deus pelo meu trabalho e, como vocês disseram, dou meu "sangue" por ele), mas, muitas vezes, paro para pensar que metade ou mais dos meus rendimentos vão para o aluguel, despesas com medicamentos e terapia, sendo que em Porto Alegre, temos casa própria (eu e meu marido que ficou lá, pois não aguentou ir e vir todos os dias pela BR 116, sempre congestionada).
Ele já sofreu um acidente no caminho para cá, na BR 116, próximo à Canoas. Estava tão cansado (pois não é fácil ter que sair daqui às 6hs da manhã, dirigir por mais de 1 hora, trabalhar o dia todo e depois, na volta, são 2 horas, no mínimo, para chegar até aqui), que acabou não percebendo que o carro da frente havia parado e acabou batendo, envolvendo 3 carros no acidente. Por sorte, ou pela mão de Deus, não sofreu lesões físicas significativas, mas ficou o medo, o abalo psicológico e, desde então, ele vem 1 vez por semana apenas.
Sofro de um transtorno chamado "Borderline", no qual, um dos sintomas é sentir-se abandonada quando os familiares ou pessoas em quem ela confia vão embora, mesmo sabendo que irão voltar (o sofrimento é muito parecido com uma despedida definitiva). Esse problema se manifestou depois que vim morar aqui.
Toda vez que meu marido vai embora, é como se ele não fosse mais voltar. Acabei entrando em depressão, tive há uma semana um surto, quebrei objetos dentro de casa. Fiquei uma semana afastada do trabalho.
Tomo diariamente 3 antidepressivos (citalopram, bupropiona e amtriptilina) + um estabilizador de humor + 3 ou 4 ou 8 (dependendo do meu estado de ansiedade) comprimidos de Rivotril + Donarem para dormir + Motrin para as dores nas costas e, ainda faço terapia e acupuntura 1 vez por semana em Porto Alegre, tudo para poder me manter aqui, trabalhando, pois preciso desse trabalho, do pouco que sobra para as demais despesas do mês (passagens para mim e meu filho até a Universidade em São Leopoldo, despesas com a faculdade, aluguel, etc....).
Vou 2 vezes por semana para a faculdade, nas outras 3 noites fico em casa, sozinha, desesperada até meu filho voltar. Se estivesse em Porto Alegre, poderia fazer a terapia corretamente (teria que ir 2 vezes por semana), certamente iria deixar de tomar tanto remédio e não teria crises tão recorrentes, pois teria o apoio de meus familiares.
Esses transtornos psicológicos acabaram resultando em problemas físicos que, em abril/2010, levaram-me a realizar cirurgia de coluna, tive que colocar implante, placas, 8 parafusos. Fiquei 45 noites sem dormir direito, devido ao colar cervical que precisava usar. Era duro e não tinha posição que fosse confortável para dormir, mas não podia tirá-lo, pois comprometia minha recuperação.
Agora, descobri que estou com síndrome do impacto nos dois ombros.
Enfim, não sabemos como será o dia de amanhã, se estaremos vivos, então, penso que devemos aproveitar nossa família, os momentos com ela e, se existe a possibilidade de estarmos mais próximos, se a vaga existe em Porto Alegre, qual o motivo de remover uma pessoa que já sofreu e vem sofrendo tanto com essa distância????
Isso é qualidade de vida? Essa é a preocupação com a saúde dos servidores?
Peço que, caso seja publicado no blog meu relato, não seja colocado meu nome, pois exerço função gratificada aqui e corro o risco de perdê-la.
Solicito que seja repassado aos colegas de Canguçu meus sinceros sentimentos e desejo de melhoras psicológicas, de superação do trauma vivido, que compartilho consternada e sensibilizada com eles."