LUTAR POR MELHORES CONDIÇÕES DE VIDA?
Publicamos a seguir contribuição ao debate sobre a questão do horário dos trabalhadores da justiça gaúcha, que nos foi enviada pelo companheiro Marco Aurélio Velleda:
LUTAR POR MELHORES CONDIÇÕES DE VIDA?
Marco A. Velleda
Boa tarde a todos os colegas do Judiciário:
Gostaria de contribuir neste debate sobre o horário, que já está riquíssimo na esfera online.
No meu ponto de vista, no entanto, não deveríamos nortear o debate a partir de uma visão individualista, o qual, apesar de válida, se ocupa, apenas, com as necessidades pontuais de cada servidor. Pensamos, isto sim, que a discussão do horário deva considerar, deva estar alinhada com uma pauta maior, qual seja, a da valorização da prestação jurisdicional, e enfrentar, sem sombra de dúvidas, o seu maior paradoxo: o acúmulo de processos e a insuficiência de servidores.
O debate que devemos estabelecer, com quem quer que esteja realmente preocupado com esta pauta, é este: o número de processos não mais condiz com a realidade do judiciário gaúcho.E isto porque, em pleno século XXI, o Judiciário teima em manter a mesma estrutura funcional (quantidade de servidores) de 1966, época em que vivíamos, apenas para lembrar, em plena ditadura,onde os conflitos pouco chega vão ao poder.
Parece que estamos bancarizando o Judiciário: diminuindo os postos de trabalho, mecanizando o atendimento ao cliente e, com isso, minimizando custos. Neste andar, logo estaremos diante de atendimentos virtuais do tipo: “ligue 1 para ajuizar ação, 2 para juntar petições, 3 para agravar, 4 para contestar, 5 para obter sentença” e coisas do gênero.
Ocorre que, como é sabido, máquinas não prescindem de operadores e, quando isto é ignorado, os resultados tendem a ser cruéis, injustos. A mera mudança de horário não resolverá esta questão, que há muitos anos vem “adoecendo” os trabalhadores do Judiciário, e fazendo com que muitos deles optem pela aposentadoria precoce, na busca por uma vida mais digna.
E, agora, vemos a Administração, ao invés de estabelecer um diálogo com trabalhadores e jurisdicionados - realmente empenhado em construir uma solução para o paradoxo acima denunciado -, apoiar-se em duas estratégias que, na prática, funcionarão como verdadeira chicane: primeiro, aparentemente equilibrar a relação entre quantidade de feitos e serventuários, enchendo os cartórios com um número elevadíssimo de estagiários e, segundo, além de continuar postergando a a necessidade de abertura para novos concurso, diminuindo uma hora de almoço. Assim que a Administração pretende mostrar à Sociedade que está preocupada com esta questão.
Por isso é que devemos manter o debate do horário sob o prisma do confronto entre qualidade da prestação jurisdicional versus número de servidores.
Podemos ver, pelos próprios dados do Tribunal e do CNJ, que o judiciário gaúcho tem, proporcionalmente, mais processos distribuídos do que São Paulo. Então, por esta ótica é que temos que fazer um debate, aonde, sim, poderemos discutir a questão do Turno de trabalho. Mas uma outra questão também se impõe neste debate online: até que ponto os servidores do Judiciário estão dispostos a lutar por melhores condições de vida?
Faço tal questionamento por termos escutado, de muitos colegas, que este horário já está definido, que foi o escolhido pelos Juízes e Desembargadores. – Buenas, se for assim mesmo, estes pessimistas estão com a razão?
Mas acreditamos na vontade e na disposição desta categoria de lutar por melhores condições de vida.
Aí, sim, podemos falar que esta proposta do TJ – uma simples redução de uma hora de almoço - é um retrocesso à qualidade da prestação jurisdicional. Argumentos temos de sobra para contrapô-la. Existem pesquisas que mostram que os trabalhadores, na sua segunda jornada de trabalho, não mais produzem o mesmo que aqueles que cumprem uma jornada contínua. Este é um dos motivos pelo qual a própria resolução do CNJ também estabelece uma jornada de 7 horas.
Não temos que definir qual o melhor horário para nossa categoria. O TJ já o demonstrou, e usou da nossa fragilidade quando nos atemos a somente a esta questão. Reduzindo nossa participação ao mínimo proposto, questões de real interesse como a jornada de trabalho única, o acúmulo de processos, o grande número de servidores doentes que se mantêm trabalhando, os bolsões de estagiários nas varas das fazendas, o enorme número de aposentadorias, os cargos de confiança e as intermináveis reclamações de processos sem andamentos, passarão despercebidas.
Enquanto isso, ficaremos centrando nossas energias somente no debate de qual seria o melhor horário.
Então, proponos começarmos, sim, a debater quais saídas temos para que este debate siga além dos limites propostos pela Administração, e quais as ferramentas de luta que pretendemos usar para não deixar que nossos colegas, fatalistas de plantão, fiquem falando que este horário já esta definido.
Então, convocamos todos os interessados, para a tarefa de realmente construir uma melhor prestação jurisdicional, que terá de passar, sem dúvida alguma, também pela melhoria da qualidade de vida dos servidores da justiça.
Assina - Marco Aurelio Velleda – 10ª Vara da Fazenda Publica / Regional da Tristeza.
E-mail -marcovelleda@tj.rs.gov.br